RUMO AO REINO DA PAZ
Capitulo 7 da Coleção IZVOR 208
O QUE TODO O HOMEM
POLÍTICO DEVERIA SABER
I
O ser humano é feito de duas naturezas (digamos assim para
simplificar): uma natureza inferior, a que chamámos «personalidade» e uma
natureza superior, a que chamámos «individualidade». Quando a individualidade
domina nele, o homem pode fazer um bem imenso ao mundo inteiro, ao passo que se
se deixa conduzir pela personalidade, que é egocêntrica, ávida, cruel, não pode
deixar de prejudicar os outros. Infelizmente, por toda a parte é a
personalidade que ocupa o primeiro lugar: nas famílias, onde se vê a mulher a
puxar sempre a brasa à sua sardinha e o marido a fazer outro tanto… na
sociedade, onde cada um procura abrir caminho a despeito dos outros… Na
política, na economia, na arte, por toda a parte, é a personalidade que se
exprime, que se impõe, que fulmina.
Mas os humanos não têm critérios suficientes para analisar a
origem das suas exigências e das suas reivindicações. Quantas vezes eles têm
experimentado mudanças e até revoluções! Mas a situação não melhorou. E por que
é que não melhorou? Porque estas revoluções não foram feitas por pessoas que
tivessem vontade de se separar das suas tendências inferiores. E enquanto não
houver uma melhoria nas mentalidades, quaisquer que sejam as reformas que elas
encarem, nenhuma situação poderá realmente melhorar. Só quando elas saírem do
pequeno círculo dos seus apetites e cobiças é que as mudanças que fizerem serão
verdadeiros melhoramentos.
Até lá, ainda que todos os homens políticos utilizem cada
vez mais a palavra «mudança»», continuar-se-á a assistir aos mesmos esforços
encarniçados de uma quantidade de ambiciosos para disputar os lugares que lhes
darão mais poderes e mais dinheiro. Eles não se preparam para assumir a tarefa
grandiosa que lhes cabe, não trabalham para se tomar mais desinteressados, mais
nobres, mais senhores de si... modelos! Isso não lhes interessa. Para que lhes
serviria melhorarem-se? Não é disso que sentem necessidade. Sentem necessidade
de lugares para terem poderes, para saciarem as suas paixões, os seus desejos
de conquista, de domínio, de vingança. Eis por que o mundo jamais encontrará a
paz!
Na realidade, a sociedade actual é tão pouco esclarecida que
encoraja todas as tendências inferiores dos seus membros. Mesmo os pais são tão
ignorantes que julgam que educam os filhos incentivando-os a obter favores e
privilégios por meios mais ou menos ilícitos. Para eles a educação é isso. Em
vez de lhes dizerem: «Prepara-te! Se um dia tiveres responsabilidades, deverás
mostrar-te à altura do teu cargo e jamais te comprometer»; não, eles dão-lhes
os conselhos mais desonestos e regozijam-se com os seus sucessos mesmo que eles
não os mereçam. Pretende-se sempre triunfar no plano material, e como para lá
chegar se é obrigado a empregar os calculismos, a astúcia, a violência,
acaba-se por destruir tudo o que se tinha de bom no seu carácter.
Vós direis: «Sim, mas se nos conduzirmos segundo os seus
conselhos, se nos formos preparar assim para nos tornarmos um modelo, as
condições no mundo são tais que ficaremos por aí, desconhecidos, obscuros, no
mais baixo da escala.» Que sabeis vós das grandes leis espirituais para tirar
semelhantes conclusões? Quando vos tornardes verdadeiramente um ser capaz,
excepcional, quando vos tornardes verdadeiramente um modelo, um sol, ainda que
não o queirais, ainda que o recuseis, os outros virão pegar em vós à força e
colocar-vos-ão no topo para os dirigirdes e os guiardes!… Se isso não acontece,
é porque não o mereceis: não estais ainda em condições, portanto, não tendes
razões para protestar.
Os humanos aspiram à verdadeira luz, à verdadeira ciência,
ao verdadeiro poder, têm necessidade disso, procuram isso, mas, como todos
aqueles com quem convivem não são modelos lá muito impecáveis, eles recorrem à
desonestidade e à violência para triunfar a todo o custo. Interiormente, todos
aspiram ao que é nobre, sublime, mas como não o encontram e se vêem rodeados de
malfeitores e de gananciosos, desencorajam-se e começam a imitá-los, adaptando
esta filosofia tão difundida: «Fazei o bem e pagar-vos-ão com o mal»… «Se se é honesto,
morre-se de fome»… «O homem é um lobo para o homem»… Então, cada vez mais,
todos se nivelam, todos sentem afinidade com as criaturas mais inferiores.
O que é triste é que, durante a sua adolescência, muitos têm
o desejo de trabalhar para um ideal, de fazer grandes sacrifícios, de se
conduzir como cavaleiros: mas ao fim de algum tempo, pelo contacto com a
realidade, sob a pressão daqueles que os rodeiam e que os aconselham a ser
«racionais», «inteligentes», eles renunciam, nivelam-se, tornam-se como os
outros. Vê-se isso por toda a parte: as pessoas têm bons desejos, bons
impulsos, só que não encontram instrutores, modelos, para as apoiar, as
aconselhar e as impedir de voltar atrás, e então, por causa de todos os pequenos
inconvenientes, por causa das troças, das zombarias, ao fim de algum tempo
tornam-se como as feras que as rodeiam.
Mas suponde que, no futuro, venham a existir criaturas que
lutam, que sacrificam tudo para conseguir realizar um ideal sublime; vereis como
depois elas serão procuradas, apreciadas, amadas. E é assim que o Reino de Deus
poderá a vir à terra. Se ele ainda não veio é porque a maioria daqueles que
governam no mundo não têm um alto ideal. Eles não são assim tão estúpidos nem
tão loucos ao ponto de terem objectivos tão sublimes! Preferem aproveitar a
situação. Mas se, um dia, alguns se decidirem a realizar este ideal aconteça o
que acontecer, então, acreditai, será o verdadeiro poder, a verdadeira luz, a
verdadeira beleza.
Só os sábios, os Iniciados, os grandes Mestres que haviam subjugado
a sua personalidade puderam deixar a sua natureza divina manifestar-se e legar
à humanidade uma obra inolvidável, eterna, indelével. Tais seres sempre
existiram – a História recorda-no-los –, mas eles são demasiado poucos em
comparação com todas essas personalidades que povoam a terra e dão livre curso
aos seus instintos inferiores: a cupidez, a hostilidade, a vingança. Quando
semelhantes seres têm responsabilidades políticas num país, não podem deixar de
fazer vítimas. É por causa dessa filosofia da personalidade que as guerras
nunca acabarão. Enquanto os humanos não mudarem de filosofia, jamais poderão
produzir-se verdadeiras melhorias: haverá sempre, em alguma parte do mundo,
guerras e misérias.
Se o Reino de Deus ainda não veio à terra, é porque todos
trabalham para uma política inspirada pela personalidade. Sim, quando eu
analiso os objectivos da política, verifico que eles são sempre medíocres. Ah!
Evidentemente, são apresentados com uns quantos adornos, uns quantos
ornamentos, para impressionar o grande público. Mas, na realidade, muitas vezes
isso equivale a dizer: «Levanta-te, para eu me sentar no teu lugar!» São todos
iguais! Mas, pouco a pouco, as pessoas compreenderão que não se pode fazer
violinos com qualquer madeira, é preciso encontrar a madeira conveniente. Sim,
os homens políticos devem ser preparados, instruídos nas Escolas Iniciáticas,
senão continuarão a arrastar os povos para a catástrofe.
Quais são, realmente, as intenções ocultas de todos esses
indivíduos que aparecem em público, que falam, que gesticulam, que fazem
discursos retumbantes? As pessoas atropelam-se para os ouvir e, como não têm
nenhuma clarividência, ficam embaladas, aplaudem, seguem-nos. É assim que os
cegos são guiados por outros cegos. Mas vós sabeis o que se diz: «Com cegos a
conduzir outros cegos, caem todos no precipício.» Infelizmente, é sempre
demasiado tarde, quando as catástrofes já aconteceram é que se dá conta desta
cegueira geral. Vede o caso de Hitler, de Estaline, e de tantos outros: que
carrascos, que monstros! E houve multidões que os seguiram e os aclamaram…
Eu também trabalho para uma política, mas uma política que
não é inspirada pela personalidade.
O que é triste é que ainda há muito pouca
gente preparada para apreender estas ideias. Ide falar às pessoas de uma
política inspirada pela individualidade, pela generosidade, pelo desinteresse,
pela luz: ninguém vos seguirá. Mas falai-lhes em destruir, em incendiar, e
imediatamente isso irá agradar a milhares de pessoas. Por isso – desculpai que o
diga – os humanos ainda precisam de sofrer.
Sim, não há outra explicação: os humanos ainda precisam de
sofrer, e um dia, por causa destes sofrimentos, encontrarão o caminho. Pensais
que eu sou cruel? Não, sinto-me triste ao dizê-lo, mas os humanos têm
necessidade de sofrer para compreender. A prova está em que, quando se
apresenta um enviado do Céu que pode esclarecê-los e ajudá-los, eles não o
escutam! E não só não o escutam como ainda o encarceram, o queimam ou o
crucificam. Mas quando se trata de um monstro, que vai fazê-los sofrer,
acolhem-no de braços abertos, aclamam-no e dão-lhe todos os poderes para os
destruir. Estudai a História e vereis que os humanos procuram aqueles que os
fazem sofrer.
Os anais da Ciência Iniciática referem que muitas
humanidades desapareceram e que algumas, como por exemplo a raça dos Atlantes,
tinham uma cultura e uma técnica muito mais avançadas que as nossas. Elas
desapareceram por causa desta tendência da personalidade que impele os seres a
quererem dominar e subjugar tudo pela violência.
E, o que é um péssimo presságio para o futuro da humanidade,
vê-se esta tendência manifestar-se cada vez mais no mundo actual. Por toda a
parte há Estados ou partidos que querem dominar e esmagar os outros, por toda a
parte se fabricam armas cada vez mais numerosas e mortíferas. Se existe uma
indústria onde não há falta de trabalho é justamente a das armas: todos os
países as fabricam para seu próprio uso e para as vender aos outros.
Presentemente, a África está cheia de armas que outros países lhe venderam;
estes países estão contentes. Enriqueceram, mas como é possível eles não
pensarem que um dia sofrerão as consequências catastróficas destas vendas de
armas?
A Inteligência Cósmica, que vive na eternidade, não se
preocupa com mais humanidade ou menos uma humanidade. Já desapareceram tantas
outras que, se esta também desaparecer por sua própria culpa, isso não a
perturbará muito: com os poucos indivíduos que ficarem, ela preparará uma nova.
Cabe-nos a nós não nos destruirmos. Se nos obstinarmos em tudo fazer para
sermos destruídos, a Inteligência Cósmica ficará imperturbável, não intervirá,
deixar-nos-á a fazê-lo.
A humanidade chegou a um grau de desenvolvimento muito
elevado, é evidente, e este desenvolvimento deve-o ao intelecto. Por si mesmo,
o intelecto é neutro, não é nem bem nem mal orientado, mas quando é dirigido
pela personalidade – o que acontece na maioria dos casos – esta tem nele o meio
mais eficaz de realizar os seus projectos mais perniciosos. Graças ao
desenvolvimento extraordinário das faculdades intelectuais, a personalidade
conseguiu-manifestar cada vez melhor as suas piores tendências: querer
açambarcar tudo e suprimir aquilo que lhe resiste.
E quando eu ouço os discursos de alguns representantes dos
partidos políticos ou dos sindicatos, digo para comigo: «Meu Deus, mas o que é
que eles imaginam! Jamais as suas actividades darão resultados. Porquê? Porque
não são exemplos, não são modelos, têm ambições, ideias preconcebidas, neles é
a personalidade que governa.» Vós direis que eles são muito inteligentes, que
sabem falar … E certo, mas isso não basta. Eles conhecem a política, a
História, a economia, mas são dirigidos pela personalidade. Quando a
individualidade vier comandar, então sim, poderão realizar alguma coisa. Mas
terão eles sequer a ideia de que existe neles uma natureza superior que deve
tomar tudo em mãos?
Nenhum homem pode tornar-se um bom chefe de governo enquanto
tiver impulsos, projectos, ditados pela ambição, pelo interesse, pela vaidade
ou pelo desejo de vingança… Nestas condições, jamais ele poderá trazer a
felicidade ao seu povo. Oh! Claro, para deitar poeira nos olhos, a fim de que
não se veja os seus verdadeiros motivos, todos encontram frases magníficas,
como a questão da salvação da pátria, a felicidade dos homens, uma verdadeira
justiça, e assim por diante. Mas a realidade, eles não podem dizê-la: se eles
se apresentassem sinceramente, tal como são, com as suas cobiças, a sua vontade
de dominar, ninguém os aceitaria. Eles sabem-no, e é por isso que intrujam,
mentem, enganam.
No passado, sim, homens como Gengis Khan, Átila, Tamerlão,
podiam obter tudo o que queriam mesmo mostrando-se exactamente como eram. Eram
outras épocas, outras mentalidades e quanto mais um chefe se mostrava cruel,
injusto, implacável, mais hipóteses tinha de triunfar. Mas agora não se pode.
Há que dissimular-se por detrás de objectivos aceitáveis, razoáveis, generosos
até, senão está-se perdido. É por isso que, actualmente, se trabalha para
adquirir maneiras convenientes a fim de produzir um bom efeito diante do
público, a fim de atrair melhor as vítimas, e, uma vez atraídas, hop,
engoli-las. É fácil: estas vítimas não têm intuição, nem inteligência, nem
conhecimentos. Com alguns métodos e tempo, mesmo um desonesto pode convencer
quase seja quem for, com a condição de não mostrar as suas verdadeiras
intenções.
Para encontrar seres que tenham objectivos verdadeiramente
desinteressados, há que dirigir-se a grandes Iniciados que deram provas, que se
purificaram, que sofreram, mas que venceram e triunfaram. Se não for o caso,
mais vale desconfiar um pouco. Se, num homem, a natureza superior venceu a
natureza inferior, podeis ter confiança nele, mas nunca antes. Antes, o que
quer que ele vos diga, desconfiai!
E também em relação a mim não vos digo que tenhais
confiança, que acrediteis, que me sigais. Digo-vos somente: «Vinde viver
comigo, vinde verificar… » E se, depois de me terdes observado durante meses ou
anos, pensardes que podeis confiar, então sereis livres de me seguir. Mas eu,
desde o primeiro dia, jamais vos pedi que me seguísseis.
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